terça-feira, dezembro 01, 2009

Julie & Julia

"O autor deve, portanto, prever um modelo do leitor possível (daqui por diante leitor-modelo), que se supõe capaz de enfrentar as expressões de maneira interpretativa, do mesmo modo que o autor as encara de maneira gerativa."
(Umberto Eco, 1995)


Sem muitas opções do que ver no cinema em Belo Horizonte, já que as estréias daqui se limitam a blockbusters desprovidos de qualquer tipo de inteligência como 2012 ou babaquices adolescentes como Lua Nova, fui ontem assistir o fofíssimo Julie & Julia, da roteirista e diretora Nora Ephron (Mensagem pra você e Harry and Sally, Feitos um para o outro) e inspirado no livro homônimo de Julie Powell.
O filme tem seu ponto de partida no início dos anos 40, quando Julia Child se muda para a França com o marido, um diplomata americano. Em busca de uma ocupação, Julia se apaixona pela gastronomia francesa e decide se matricular em uma escola para aprender os segredos da culinária mais refinada do mundo. A partir daí, a história é conhecida pela maioria, Julia Child lança um livro de culinária francesa e se torna uma das conzinheiras mais famosas do mundo. 60 anos depois, mais precisamente no anos de 2002, a obra de Julia Child é relembrada por Julie Powell, uma jovem de 30 anos de idade, frustrada por uma carreira de jornalista malsucedida. Seguidora de Julia Child, Julie encontra na minúscula cozinha da quitinete em que vive com o marido o refúgio para sua frustração. E é ali, sempre apoiada pelo marido, que Julie se lança ao maior desafio de sua vida: um blog intitulado The Julie/Julia Project. Durante os 365 dias do ano, Julie testará as 534 receitas de Julia e relatará suas experiência naquela página. E é aqui se encontra o maior trunfo do filme. Ao mergulhar na obra deixada por Julia - cabe aqui lembrar que além do livro, existe uma série de vídeos da cozinheira - Julie descobrirá que tem em comum com Julia muito mais do que o simples hobby de cozinhar. Temos, então, um exemplo daquilo que Umberto Eco classificou como leitor modelo. Leitor Modelo seria o leitor ideal de uma obra, seja literária, visual, etc, aquele que pode interpretar o texto de maneira semelhante aquela que o autor gerou. Julia Child & Julie Powell encontraram na gastronomia o refúgio para uma vida simplória, o desejo de cozinhar transformou a vida das duas mulheres, tirando-as da mesmice que a rotina opressora. Julia, assim como Julie trabalhava para o governo, e estava em busca de algo que trouxesse realização tanto profissional quanto pessoal.

(Relação semelhante podemos encontrar no filme As Horas. Laura Brown, personagem interpretada por Juliane Moore, é a leitora ideal de Mrs. Dolloway, escrito por Virgínia Woolf. Cabe, no entanto, destacar que As Horas e Julie & Julia apresentam proposta diferenciadas.)

>>

Não gostei de Meryl Streep no papel de Julia Child, embora ela tenha de fato encarnado a personagem, como vocês podem ver no vídeo abaixo, com a Julia Child verdadeira. A voz dela, caricata demais, me irritou profundamente, provocando em mim altos surtos psicóticos ao longo do filme.



PS.: Aguardo ansiosa para a estréia de Abrazos Rotos, de Pedro Almodovar, e do brasileiro É proibido fumar. Abrazos Rotos tive notícia que vai estrear por aqui neste final de semana, É proibido fumar, eu não sei, mas se estrear vai ser um final de semana enfurnada no cinema.







 
Creative Commons License
Estrela Torta by Juliana Semedo is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Compartilhamento pela mesma Licença 2.5 Brasil License
BlogBlogs.Com.Br